A capital do ducado de Sycamore é um bosque de figueiras
gigantes entrelaçadas nas planícies centrais de Feídr. As árvores
élficas são altas como catedrais e largas como cidades. Muitas raízes
saindo dos galhos formam troncos secundários e ainda assim enormes. E os
galhos de uma avançam na copa da outra. Alguns dos mais de cem mil
habitantes são tão dedicados às árvores que se desacostumam a pisar no
chão. Comem frutas, cipós fritos, geléias e espetinho de cigarras. Bebem
sucos, orvalho, cidras, vinhos e conhaques. A variedade e potencial de
misturas é grande o suficiente para se gastar toda uma vida élfica
experimentando tudo. A maioria das casas estão penduradas à treliça de
galhos, cipós e cordas de seda. Cortar certos fios estruturais pode ser
catastrófico, como os próprios sycamorianos demonstraram ao derrubar
diversos prédios sobre os atacantes no cerco goblinóide em 1402.
A atração mais popular da cidade são os Pomares do Saber:
sacadas circulares de seiva-vidro. Ao serem preenchidas pelas chuvas,
criam espelhos d'água de fundo transparente onde crianças aprendem a não
temer as alturas. As bordas tem árvores de estudo com ramos elásticos,
cada folha uma página de um livro usado como adubo para a respectiva
árvore. Embora abertas para todos, arrancar uma página gera uma maldição
em que as ações e pensamentos íntimos do culpado passam a ser inscritas
em novas folhas que caem e se espalham. Mesmo assim, sabe-se que
algumas pessoas arrancaram folhas para ter as suas vidas expostas. Um ou
outro é uma leitura popular, cheia de aventuras e situações inusitadas.
Tudo é administrado pela dríade bibliotecária Diaphénne. Ela cultiva
cada planta com afeto e orienta os leitores com cuidado, pois todas as
árvores aqui descendem dela e de seu amor pela palavra escrita.
Visitantes podem ler dentro das piscinas, pois a água não danifica as
folhas. Diaphénne também narra histórias todo dia, absorvidas de suas
filhas pelas raízes.
Dezenas de espécies de árvores frutíferas diferentes estão
enxertadas nas figueiras, beneficiando-se da seiva encantada destas
últimas para se tornarem muito produtivas. Estas plantas também estão
encapsuladas em estufas suspensas. Os painéis são mosaicos de
seiva-vidro vinda de artesanato falho. Luz do sol passada através destes
cristais parecem ficar mais forte. Ardenellíe é o maior centro de
produção agrícola em toda Feídr e fonte de quase toda a seiva-vidro no
império. Um conselho de anciões e chefes de guildas administra a cidade.
Eu olho para a capital de Sycamore e penso: é como se o
próprio Ourgos tivesse cultivado um andaime titanico a partir das
árvores, mas desistido antes de usá-lo para construir algo. E então os
elfos colonizaram o que ficou. Mas tudo está de acordo com o que os
elfos planejaram, uma demonstração do misto de engenharia e botânica de
que são capazes. As raízes que saem dos galhos longos e horizontais caem
até os galhos abaixo, formando arcos sobre arcos calculados com décadas
de antecedência. Note como a textura da casca é uniforme demais para
ser aleatória. Os troncos tem sulcos desenvolvidos para canalizar a água
da chuva em cataratas que não prejudicam construção alguma. As
cicatrizes e queimaduras do cerco de 1402 foram cuidadosamente tratadas
ou escondidas. Diversos galhos tem o topo plano e estriado de forma a servirem como "galhovias".
Agora escute: Os locais mal notam, mas o dia-a-dia traz um
milhão de zunidos que revelam o poder da cidade; Redes de seda prateada
sob imensa tensão transmitem e armazenam força motriz de cataventos
feitos de folhas das próprias figueiras gigantes. Isto move elevadores,
balistas, moinhos. O orvalho acumulado nas sedas enche cisternas e
fornece água potável para a cidade inteira. Essa sinfonia ao fundo vêm
de um grupo de malabaristas municipais saltando nas cordas de uma harpa
gigante. O ritmo ajuda todos a trabalharem, medirem horários e manter a
disciplina, além de soar bem aos ouvidos. Lá embaixo, as raízes
tabulares servem de cimbres para as colinas ao redor. Isto forma adegas
subterrâneas com os melhores vinhos do mundo. Artesões thorakitai
reconhecem a cidade como uma das seis maravilhas da arquitetura
imperial. Eu próprio tenho mãos com calos capazes de literalmente
quebrar quartzo e digo que este lugar é lindo.
-Kosuf Dagda Dedos-de-Clava, grão-mestre da Ordos Malica.
Os elfos e demais raças ocupam cerca de um quinto do espaço
disponível. O restante forma uma reserva de caça tridimensional onde
arqueiros treinam uma mistura de malabarismo e arte marcial durante
muitas vidas humanas. Existem larvas de mariposa, enormes e felpudas,
cuja seda prateada é usada para arcos, cordas, até transmitir e
armazenar força de cataventos que movem moinhos, catapultas, elevadores e
balistas; os gaúdans são lobos vermelhos de listras pretas, aptos a
andar nos galhos e escalar troncos; beijo-de-flecha é o nome dos
beija-flores grandes e agressivos como águias, com línguas agulhadas que
conseguem perfurar as figueiras gigantes e sugar seiva encantada.
Também existe um refúgio de ladrões e escravos fugitivos em
algum galho oco nas profundezas da reserva. Formada por goblinóides
sobreviventes do cerco de 1402 que encontraram a toca de algum animal.
Agora acredita-se que já seja uma comunidade de centenas no interior de
diversos galhos, formando uma rede de túneis labirínticos que conduzem a
um mercado negro.
Mas o que os elfos mais temem é o Inulpamahuida: um tipo de
árvore carnívora ambulante. O nome significa "aquilo que sobe
montanhas", mas ninguém sabe dizer se existe fora daqui. Se parece com
um polvo feito de madeira com raízes espinhentas que escalam muito bem.
Os galhos encaracolados secretam um gel adesivo e ácido. E quando mais
se debater para escapar, mais grudado fica. Os animais e pessoas que
forem pegos por um Inulpamahuida estão condenados a serem digeridos
vivos por muito tempo. O gel estanca sangramentos, garantindo que a
"comida" continue fresca e prolongando a tortura.
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